
Crónica do Investigador | A Ana Rita Costa é uma investigadora pós-doutorada na área das neurociências no Departamento de Bioquímica e Biofísica da Universidade de Estocolmo e no ScilifeLab. O foco da sua investigação é compreender como os neurónios que produzem serotonina estão envolvidos no processamento da ansiedade. Neste artigo, aborda o quanto ainda desconhecemos sobre o processamento da ansiedade pelo cérebro e como esse conhecimento limitado dificulta o desenvolvimento de tratamentos mais eficazes.
A ansiedade é um dos distúrbios mentais mais comuns, afetando cerca de 310 milhões de pessoas em todo o mundo, o que corresponde a 4% da população mundial. Embora existam tratamentos disponíveis para a ansiedade, estes ainda apresentam eficácia limitada, não sendo eficazes para muitas pessoas.
Em determinados contextos, sentir ansiedade é normal e, até certo ponto, necessária. Quando não é patológica, a ansiedade desempenha um papel crucial na nossa sobrevivência, ajudando-nos a identificar perigos e a preparar-nos para situações desconhecidas, funcionando como um motor que impulsiona ou reprime a exploração e que regula a adaptação a novos desafios.
Compreender como o nosso cérebro processa a dinâmica ansiedade-exploração é fundamental não só para desvendar os mecanismos que regulam o comportamento mas também desenvolver estratégias mais eficazes no tratamento e prevenção de transtornos associados.
Um dos neurotransmissores que desempenha um papel central neste processo é a serotonina. Este neurotransmissor é sintetizado por um grupo específico de neurónios localizados no tronco cerebral, conhecido como núcleos da rafe. Estes neurónios estão envolvidos numa ampla gama de funções, desde a regulação homeostática básica até à modulação de distúrbios psiquiátricos e de humor.
A ligação entre a serotonina e ansiedade é sustentada por evidências científicas, nomeadamente pelos efeitos farmacológicos dos inibidores da recaptação da serotonina, uma das classes de medicamentos mais frequentemente prescritas no tratamento da depressão, mas também amplamente utilizados para a ansiedade. Apesar da sua utilização generalizada, a eficácia desses fármacos é limitada, e os mecanismos pelos quais o cérebro, e em particular os neurónios produtores de serotonina, influenciam esses processos permanecem pouco compreendidos.

O principal objetivo deste projeto é investigar de forma detalhada como, num cérebro saudável, os neurónios que produzem serotonina e a informação que transmitem para diferentes áreas do cérebro estão envolvidos no processamento da ansiedade, através da manipulação e monitorização da atividade neuronal. Ao estudar o comportamento desses neurónios em condições normais, é possível identificar os mecanismos neuronais que regulam a gestão da ansiedade, revelando como essa regulação pode ser comprometida em distúrbios psiquiátricos, nos quais o processamento da serotonina pode estar alterado. A compreensão aprofundada desses processos não só ajudará a desvendar os mecanismos subjacentes à ansiedade, mas também abrirá caminho para o desenvolvimento de terapias mais eficazes.
Referências:
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